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A BOMBA RELÓGIO DO OFICIALATO DO JUDICIÁRIO POTIGUAR

Passados mais de 20 anos sem concurso público, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte publicou a Resolução 68/2022-TJRN, autorizando a realização de concurso público para preenchimento de 2 vagas para Oficiais de Justiça, área judiciária, e mais 48 vagas para cadastro de reserva. Também foi aprovado concurso público para provimento de 160 cargos de Técnico Judiciário, área judiciária, e mais 288 vagas para cadastro de reserva. Em comparação com número de vagas de Técnicos Judiciários e de Oficiais de Justiça, a quantidade é imensamente desproporcional, contrariando os princípios da razoabilidade e da eficiência, tanto almejados pela Administração Pública.

Conforme consta do próprio site do TJRN, na aba Transparência, o Quadro Quantitativo de Cargos e Funções, disponibilizado na forma do Anexo IV, da Resolução nº 102/2009-CNJ, para fins de cumprimento do disposto no inciso II, do artigo 3º, deste instrumento normativo, o déficit atual é de 102 Oficiais de Justiça.

Infelizmente, os Oficiais de Justiça não têm nada a comemorar. Em 2002, éramos cerca de 708, hoje somos apenas 396 profissionais.

Importante destacar, ainda, que desde abril do corrente ano, vários dos Oficiais de Justiça se aposentaram e cerca de 70 estão percebendo abono de permanência, muitos deles aguardando a implantação do quinquênio, cujo período de aquisição foi suspenso pela LC 173/2020, para pedir a aposentadoria.

Ademais, temos vários colegas com restrições laborais, outros de licença médica, o que é comum hoje em dia, além do que temos readaptações de Oficiais de Justiça para outras funções devido à sobrecarga de trabalho.

O pior, é que estamos adoecendo cada vez mais. De 2002 até hoje o número de mandados praticamente quintuplicou, mas o número de Oficiais de Justiça reduziu pela metade. Não bastasse isso, colegas das comarcas do interior ainda cumprem mandados da Justiça Eleitoral e da Justiça Federal, sem nada receber pelos gastos de deslocamentos.

Nos próximos meses, teremos mais 2 Oficiais de Justiça em exercício, sendo que, em contrapartida, teremos 160 técnicos judiciários os quais, sem dúvida, produzirão mais e mais mandados, o que, consequentemente, gerará maior sobrecarga de trabalho.

Digno de registro, ainda, que os plantões não são remunerados e as folgas por esses plantões não são realizadas de fato, isto porque, ao retorno das folgas compensatórias, os Oficiais encontram os mandados represados à espera de distribuição, havendo a necessidade de cumprimento, não havendo limites para isso. O mesmo ocorre com as férias.

Ao contrário do que se imaginava, nem sequer a virtualização do processo judicial reduziu as atribuições dos Oficiais de Justiça. Isto é um mito. Ao contrário, trouxe mais atividades, como as de pesquisa, impressão, certificação e digitalização. Às vezes, levamos mais tempo na devolução do mandado que do próprio cumprimento.

Pior ainda, que “além da queda, o coice”. Não há qualquer limitação de quantidade de mandados distribuídos, conforme a Portaria Conjunta nº 10/2017-TJ, de 29 de maio de 2017. Todos os mandados expedidos são distribuídos, ocasionando estresse, ansiedade, fadiga e depressão pela carga de trabalho, acúmulo de mandados, cobranças e metas a que estamos submetidos e pelo prazo exíguo para cumprimento, pois o Provimento 005/2000 da CGJ determina que temos o prazo de vinte (20) dias úteis para a devolução dos mandados. Estamos enfrentando PAD’s e sindicâncias, pois somos obrigados a devolver todos os mandados antes das férias devidamente cumpridos. Como alguns não conseguem, as férias estão sendo suspensas. Necessário frisar que as Direções de Foros nunca elaboraram atos complementares, de modo a garantir que os oficiais entrem em gozo de férias sem acumulação de mandados, conforme disciplina esta própria portaria conjunta 10/2017, afigurando referida situação em um duplo castigo.

Infelizmente, estamos andando na contramão da eficiência. Por meio da LCE 715/2022, o TJRN permite que servidores de outros órgãos cumpram mandados judiciais, atividade semelhante à figura do AD-HOC, já existentes em nossos quadros, não se tratando de situação excepcional, tampouco transitória, mas, sim, de uso permanente. A utilização desses servidores de outros órgãos para o cumprimento de mandados, sem a exigência do bacharelado em Direito, exigência da LCE 715/2022 para o cargo de Oficial de Justiça, além de burlar o instituto do concurso público, insculpido no art. 37, II da CF/88, impacta diretamente na efetividade e qualidade da prestação jurisdicional, ferindo de morte o princípio da eficiência.

The clock is ticking. Algumas Centrais de Mandados colapsaram. As mais conhecidas são as Centrais do Fórum Miguel Seabra Fagundes, de São Gonçalo do Amarante e de Parnamirim. Como exemplo, em 2002, a Central de Mandados do FMSF contava com 144 Oficiais de Justiça. Hoje não tem mais de 70 em efetivo exercício, muitos destes irão se aposentar nos próximos meses. Só das Varas de Execução Fiscal e Tributária, há mais de 1.300 mandados paralisados aguardando cumprimento por mais de 45 dias.

Entenda! Como não há limitação de mandados, à medida que os colegas vão se aposentando, a carga de seus mandados será dividida com os Oficiais de Justiça remanescentes, bem como, os plantões, expondo-os cada vez mais à carga de trabalho elevada e, muitas vezes, excessiva e desumana, acarretando‐lhes estresse emocional e fadiga, danos impingidos à saúde física e mental destes servidores. Como não há o pagamento pelo trabalho extraordinário, um volume grande de mandados semanais pode levar o Oficial de Justiça ao rompimento da jornada de trabalho, além de fazê-lo trabalhar aos sábados, domingos e feriados, o que pode reduzi-lo à condição análoga à de escravo, pela jornada exaustiva, o que pode se configurar um crime, conforme art. 149 do CP. Quem pode nos ajudar, já que o próprio TJRN não nos acolhe? A OAB – Ordem dos Advogados do Brasil? A AMARN – Associação dos Magistrados do Rio Grande do Norte?  A OIT – Organização Internacional do Trabalho? Quem? O tempo urge, pois a bomba está próxima de explodir. A quantidade de mandados represados e os prazos aguardando cumprimento só aumentam. Talvez em meados do primeiro semestre de 2023, a Justiça Potiguar colapsará por completo, pela quantidade de Oficiais de Justiça com abono de permanência que, insatisfeitos e indignados com a publicação da baixa reposição por concurso dos cargos de Oficiais de Justiça, se aposentarão. É o que se escuta nos corredores de nosso Egrégio TJRN.

Por José Francisco Campos,

Diretor-coordenador do Sindojus-RN, em nome da Diretoria do Sindojus-RN.

Publicado por Assessoria da Fesojus-BR, jornalista Patrícia Claudino.